Ramal da Lousã – Projecto<br>do PCP relança esperança

Vladimiro Vale

A cir­cu­lação no Ramal da Lousã foi en­cer­rada a 4 de Ja­neiro de 2010. Os utentes são desde então trans­por­tados de au­to­carro, por acordo com uma em­presa pri­vada. Assim se en­cerrou um Ramal fer­ro­viário que servia os po­pu­la­ções de Coimbra, Mi­randa do Corvo e Lousã. O pre­texto do en­cer­ra­mento foram as obras de im­ple­men­tação do Sis­tema de Mo­bi­li­dade Metro Mon­dego (MM).

A luta em de­fesa deste Ramal co­meçou há muito. A So­ci­e­dade MM, fun­dada em 1996, anun­ciou a nova so­lução de mo­bi­li­dade. O PCP, acom­pa­nhando rei­vin­di­ca­ções das po­pu­la­ções e do Mo­vi­mento de De­fesa do Ramal da Lousã (MDRL), desde o início se opôs à im­ple­men­tação da so­lução MM neste Ramal por não se ade­quar às ne­ces­si­dades, desde logo porque tra­tava de im­ple­mentar uma so­lução de trans­porte ur­bano numa linha de mon­tanha.

O PCP e as po­pu­la­ções aler­taram que o pro­jecto MM no Ramal da Lousã cons­ti­tuiria uma perda para a ca­pa­ci­dade de de­sen­vol­vi­mento da re­gião, seria mais caro, com menos ve­lo­ci­dade de cir­cu­lação (au­men­tando o tempo de trans­porte em 25%), menos con­for­tável (com menos lu­gares sen­tados), sem ca­pa­ci­dade de trans­porte de mer­ca­do­rias, sem li­gação à rede fer­ro­viária na­ci­onal, sem pos­si­bi­li­dade de con­ti­nu­ação da linha.

A luta foi pro­lon­gada, com altos e baixos, mas a per­sis­tência e a jus­teza dos ob­jec­tivos teve re­flexo este ano, com a apro­vação do pro­jecto de re­so­lução do PCP na As­sem­bleia da Re­pú­blica, que se pro­nun­ciou pela: ex­tinção da So­ci­e­dade MM e De­vo­lução do seu pa­tri­mónio ao do­mínio pú­blico fer­ro­viário e ao do­mínio mu­ni­cipal (votos a favor: PCP, PEV, PAN; abs­tenção: BE, PS, PSD, CDS) e pela re­po­sição, mo­der­ni­zação e elec­tri­fi­cação da linha do Ramal da Lousã (votos a favor de PCP, PEV, PAN, BE, PSD, CDS; abs­tenção: PS).

Vá­rias forças po­lí­ticas de­mons­traram, du­rante este pro­cesso, hi­po­crisia e falta de res­peito pelas po­pu­la­ções. O per­curso zi­gue­za­gue­ante destas forças re­flete também a per­sis­tência da luta. Em 2010 o PCP tinha apre­sen­tado um pro­jecto com o mesmo teor – PS, PSD e CDS vo­taram contra. Em 2015 o PCP apre­sentou no­va­mente o pro­jecto, PSD e CDS vo­taram contra e PS e BE abs­ti­veram-se.

Con­ti­nuar a luta

A his­tória cen­te­nária do Ramal não lhe re­tirou im­por­tância. Mi­randa do Corvo e Lousã viram au­mentar os seus re­si­dentes, em pro­cura de ha­bi­tação a preços mais aces­sí­veis. O Ramal re­gis­tava mais de um mi­lhão de utentes/​ano. A li­gação entre Ser­pins e a es­tação de Coimbra-Parque era efec­tuada 17 vezes por dia, em cerca de uma hora. Em 1992, foi ex­tinto o trans­porte de mer­ca­do­rias, o que pre­ju­dicou os in­te­resses da re­gião.

Em Ja­neiro de 2010, ini­ci­aram-se as obras da MM, com o ar­ranque dos carris e a re­gu­la­ri­zação do canal do Ramal da Lousã. No final de 2010, in­vo­cando cons­tran­gi­mentos fi­nan­ceiros no âm­bito do PEC III, a REFER or­denou aos em­prei­teiros a su­pressão dos tra­ba­lhos. As po­pu­la­ções foram su­ces­si­va­mente en­ga­nadas com a cum­pli­ci­dade dos exe­cu­tivos au­tár­quicos de Coimbra, Lousã e Mi­randa do Corvo.

Na ci­dade de Coimbra, o pro­jecto MM sig­ni­ficou a des­truição de parte da Baixa, a de­ses­tru­tu­ração da cir­cu­lação de pes­soas e foi con­ce­bido de costas vol­tadas para os Ser­viços Mu­ni­ci­pa­li­zados de Trans­portes Ur­banos de Coimbra (SMTUC).

As li­nhas mais ren­tá­veis dos SMTUC se­riam en­tre­gues à So­ci­e­dade Metro Mon­dego sem que isso sig­ni­fi­casse acrés­cimos de fi­a­bi­li­dade sig­ni­fi­ca­tivos. Os SMTUC fi­ca­riam numa si­tu­ação ainda mais di­fícil o que sig­ni­fi­caria, a médio prazo, a sua de­ses­tru­tu­ração. Os SMTUC são ser­viços igual­mente cen­te­ná­rios: têm ac­tu­al­mente cerca de 138 vi­a­turas, 467 tra­ba­lha­dores, 88 li­nhas, 550 Km de rede. Servem cerca de 15 mi­lhões de pas­sa­geiros/​ano e não têm qual­quer apoio do Or­ça­mento do Es­tado. O PSD na au­tar­quia até 2013 de­fendia a em­pre­sa­ri­a­li­zação dos SMTUC. A ac­tual mai­oria PS de­fende a fusão dos SMTUC com a MM e con­se­quente en­trega a pri­vados. A luta das po­pu­la­ções e dos utentes, a par da in­ter­venção da CDU nos ór­gãos au­tár­quicos, têm vindo a es­treitar a margem para avançar com estes pro­jectos.

A apro­vação do pro­jecto do PCP é muito im­por­tante, mas é im­pres­cin­dível que as po­pu­la­ções con­ti­nuem a lutar e a exigir que se cumpra o que foi apro­vado na AR. O mi­nistro-ad­junto, numa re­cente vi­sita à re­gião, afirmou que «o meio fer­ro­viário é uma pri­o­ri­dade do Go­verno e um dos me­lhores ins­tru­mentos de li­gação de re­giões». Cabe às po­pu­la­ções exigir que se cumpra esta pri­o­ri­dade no Ramal da Lousã. Para isso sabem que podem contar com o PCP.




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